28 agosto 2014

Sair de casa: A história de uma migrante

Adeus, conforto infantil

Duas semanas volvidas e estarei, novamente, de partida sobre o cruel oceano que mantem reféns os segmentos infantis da minha existência.
Mais uma vez, a curta espera no aeroporto e o derradeiro abraço comprido. Mais uma vez, a entusiasmante corrida diária engrandecida pela tarefas urgentes de sobrevivência.
Se, também, está de partida, eis 5 momentos para os quais se deve preparar...

A primeira refeição solitária
Devorar uma porção de "alface" sem companhia já não era novidade e, no entanto, fazê-lo a uma viagem de duas horas de casa concentra uma centelha de irrealidade.
Marca, inexoravelmente, o corte incisivo com os velhos hábitos e até com o idoso "eu" conservado na rotina da companhia parental. 
Liberta-o e, simultaneamente, empurra-o para um mundo onde se encontra perdido num verdadeira aventura.
Ordena um olhar nostálgico que se refresca e começa a viver...

A aventura do regresso
 São incontáveis as vezes em que amaldiçoei o meu completo descontrolo e absoluta vontade de transportar, em todas as oportunidades, metade da casa às costas.
É que carregar vinte quilos pela esburacada calçada portuguesa é mais complexo e exige mais orientação do que alguma vez imaginou.
Chegar, finalmente, ao pavimento escorregadio da estação do metro parece nada menos do que uma utopia, quando a cada dois minutos tende a parar de exaustão.
No entanto, a aventura não acaba com a concretização da miragem, segue-se o incrível desafio de transportar meio mundo para o interior do impaciente comboio e, ainda pior, a tarefa de dividir um degrau incessante com aquele volume avassalador.
Após um ano de overpacking e de dores residuais que se seguiam aos dias de viagem, não há lição mais evidente - que decerto falharei no cumprimento: arraste só o estritamente necessário e facilite estes regressos solitários!

A inexistência de tempo e de reservas alimentares
Todas as sextas-feiras, lá ia eu de mala a tiracolo reabastecer as minhas reservas alimentares: uma caixa de cereais, dois quilos de fruta e múltiplos caminhos rápidos para a semana que se seguiria.
Todavia, a existência de um adulto não é sempre coroada por tal disponibilidade e, mesmo que seja sublime na gestão do seu tempo, existem, inevitavelmente, aquelas semanas em que nem dispõe de minutos para se olhar ao espelho - muito menos para dançar no supermercado enquanto seleciona a guloseima do dia seguinte.
Quantas manhãs apressadas de sábado, fui eu, finalmente, cumprir a lista da semana, já só com opções escassas para o almoço.
Mantenha uma porção de sobrevivência e delicie-se com os dias aflitos de leituras sem fim e cenoiras que se esgotam num abrir e fechar de olhos!

As maleitas repentinas
Talvez o momento mais agoniante nestas viagem de existir por completo - aquele em que, realmente, desejamos estar ao cuidado de outros - seja o dia irrecusável em que a doença nos apanha.
Debilitados pelo desgaste doentio, nada nos pareceria melhor do que a doce carícia de um chá não feito por nós e de um grande copo de água do lado do nosso leito trazido com amor e dedicação.
Uma pequena recordação infantil que nos é restringida...
Somos atirados para o mundo sem segurança e com o gigante dever de ser resilientes e autónomos.
A cruel realidade que nos molda como criaturas crescidas, geladas e fechadas ao auxílio.

Os momentos de crise
Existem depois, é claro, os minutos de profunda depressão - ou TPM - em que ficar em casa parece uma canção de embalar!
Por vezes, saudades, por outros, apenas, vontade de regressar a um espaço de conforto original, mas sempre vulneráreis perante esta nova experiência.
O melhor antídoto - usado e comprovado - é a manutenção da sua felicidade: todos os dias, cuide de si e garanta a continuação daquele momento em que se apercebe do quão sortudo é ao por pisar aquele chão!

Não tema o supremo voo que rompe com o brilho paternal. Venha viver estas travessuras, sentir-se triste e à beira do precipício - especialmente, quando se equilibra nas escadas rolantes com a bagagem - enquanto, dentro de si, brota uma nova energia. 
Certamente, a magia de um eterno jovem tornado herói!

Inspirado na vida, 
IP

Sem comentários: