06 dezembro 2011

Descrição de um semelhante a Narciso

Perco, a cada diz que se esgota, a capacidade de ser irracional, a capacidade de adaptar a paixão ao corrente. Porém, em cada minuto desbotado, cria-se, também, a vontade de ser intocável e eu, ser egoísta, cedo à tentação, saciando o meu desejo no poder liquido que, agora, se derrama nos meus lábios. Entornada na minha boca, a leve ilusão de maturidade é consumida pelo ego que segue narciso. Contudo, a generosidade do meu fundo não é nunca apagada, apenas removida dos átomos constituintes do meu ser. Sei, hoje, carpir melhor que qualquer lágrima, mas nunca carpi na vida, pelo menos não como precisava. Afasto-me, porém, da nívea tentação que se apresenta; para mim, o sofrimento é níveo, talvez porque a luz é demasiado similar à alvura e a claridade  é o cortar do último fio que prende o meu ser anímico ao meu ser real. A luz é o fim do meu ser narcisista, é o começo do meu ser calmo e que não reconheço. Sigo os caminhos de Hugo, e adoro a escuridão, talvez porque nela se esconda a nossa amiga, que tanto evitamos e tanto tentamos aproximar. Mas é no dia, na dor e na mais profunda estranheza que encontro a fragilidade que preciso para superar o egoísmo e cingir-me à arrogância e à captura de todos os meus desejos por novos acepipes. Sinto-me faminta, faminta de um mundo que não esteja corrompido pela conformidade, semelhança e ociosidade. Sinto o meu interior rugir pelo mais divino céu e pelo mais profundo Inferno. As minhas asas começam a perder as penas, qual anjo garrettiano que peca. Sinto-me com vontade de ceder e consumir a vida mundana, peregrinado, por isso, nos vales de dor, tal «Anjo Caído».

2 comentários:

Mary disse...

isto está simplesmente fantastico miga, se ao menos eu soubesse escrever tao bem como tu...
;)beijos

IP disse...

LOL todos somos capazes, basta tentar! Bah beijo :)