Viver sob o sol público
E eis que, chegada à terra prometida, a criatura regozija-se. Sente-se a sortuda escolhida de um destino já traçado e, ridiculamente, amado. Olha a calçada como mera estrada efémera que, em menos de nada, se transformará num terreno bucólico e idílico coberto por edíficios estéreis.
Finalmente, perto do ar quente e sufocante da fúria citadina!
Dia após dia, o desconhecido ninho ganha novos tons de familiaridade e, enfim a sós com a cidade, o salto parece ainda em progresso...
Lembro-me dos exatos momentos que precederam esta mudança. Recordo a música vinda de uma rua distante, enquanto eu, sentada no único degrau, pensava na rotura iminente. Em mim jazia então uma dor impercetível e insuportável. Um sonho que insistia na minha destruição e aliciava um demónio sedento de mais e mais transformação.
Os dias pareciam bonitos e o vento já anunciava as folhas caídas que me cativam e induzem na mais profunda e maravilhosa reflexão.
Depois, já só havia o constante sol e a sua ação reveladora numa cidade que não conhece limites. De novo, os dias esfumam-se e, somente, desta vez, sinto-me capaz de olhar a passagem inexorável do tempo como realidade distante. É que afinal nada resta de mim para um mundo fascinante que consome pedaços horrendos da criatura meio reservada, meio excêntrica.
Agora, sob um olhar mais público do que nunca, resta-me a opção de emergir deste enorme luar que me tem mantido refém e esquecer a ausência de uma melodia infantil.
"É a Hora!"
Inspirado na vida,
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